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sexta-feira, 22 de março de 2013

Uma educação curta para vídeos curtos

Texto publicado no livro "Vi vendo... Histórias e histórias de 10 anos das oficinas Kinofórum" em 2012.

O NCA surgiu em um contexto de educação audiovisual e não à toa a primeira coisa que negamos quando resolvemos fazer um coletivo foram as “benditas” oficinas de vídeo, que vinham como a boa nova do além mar das tecnologias, para os sem rumos da periferia e sua ociosidade. Um discurso bem estranho pairava, ora carregado pela possibilidade de falar da nossa história como a mídia não dizia, ora com o rosto do subemprego na máscara do CaboMan.
Não que o processo de formação audiovisual não tenha sido importante, afinal foi ele que abriu portas para o início da caminhada, porém a questão à saber é para que propósito fomos inseridos nesse nicho do cinema e video. Pois hoje, quase 10 anos depois do primeiro contato com as câmeras muito pouco mudou. No nosso caso foi e ainda tem sido muito difícil. E isso considerando que nós sempre nos dedicamos a ampliar nossa formação técnica e conceitual. Mas acabamos por perceber que para além disso existe um universo de circunstâncias e questões que impedem o avanço dos que como nós optaram pela constituição de um coletivo de produção audiovisual.
No princípio o ímpeto para a formação do Núcleo de Comunicação Alternativa foi a necessidade de gritar. Como já disse John Holloway “no princípio era o grito!” . A sanha de ser ouvido, de propor nosso ponto de vista, de se desintoxicar da velha imagem construída sobre a periferia e seus moradores e principalmente de expor problemas que pouco haviam sido discutidos por nós pertencentes à essa realidade de exclusão.
Nosso grito, como o de tantos outros como nós, era nossa forma de existir de nos expresser para o mundo, era nosso meio de buscar sentido, mas todo ato de gritar depois de um tempo nos leva à rouquidão. E isso oficina nenhuma nos ensinou, e talvez não tivesse mesmo de ser assim, todo processo que nos trouxe até aqui foi importante, mesmo percebendo o quão cansados estamos hoje. Pois atualmente não somos mais os jovens da ONG e sim adultos com responsabilidades e demandas muito maiores que na mocidade. O tempo e as escolhas que fizemos não foram compatíveis com as exigências de mercado.
Primeiro porque por mais que nesse período todo de existência do grupo tenhamos nos especializado e atualizado, o trabalho na área sempre nos foi precário. (Quando não tinhamos recursos dos editais de baixíssimo orçamento como o VAI e outros do governo federal, o que nos restava eram os trabalhos em “parceria” com grupos artísticos e pequenas produtoras, onde a regra era sempre, pouca verba, para muito trabalho e muitas exigências. E quando mesmo essas alternativas eram escassas o terceiro setor nos acolhia, como a madame de “bom coração” que dá esmola ao garoto no farol para sentir-se socialmente comprometida, sempre com olhos de afago e mãos de chicotada). Segundo por que a acessibilidade ao conhecimento e a equipamentos necessarios à produção nos foi por muitas vezes negado. A teima nos trouxe aqui não as ONGs.
Para as ONGs, por mais que negassemos esse rótulo, nós sempre fomos os filhos rebeldes de seu ventre. Os meninos que deram “certo”. Mas a única certeza que sempre tivemos, mesmo antes das primeiras oficinas de formação, era que vindo de onde viemos tudo seria mais complicado. Afinal nossas mães diaristas nunca puderam bancar FAAP para que nos formassemos para a inserção na pequena brecha do mercado audiovisual. Pois como enfatizou “Alex” do grupo Cinema Nosso do Rio de Janeiro em depoimento no documentário Videolência “…Se para quem vem das universidades de cinema já é difícil imagina para quem sai dessas oficinas?”
Não nascemos filhos, nem sobrinhos, nem netos de donos de produtora ou de diretores renomados do cenário nacional. Nosso berço é outro e nos orgulhamos disso, não pelas casas sem reboco, ou pelos esgotos à céu aberto, mas pela dignidade que as pessoas daquele lugar conseguem ter mesmo nas mais duras condições de subsistência. Somos frutos da antepromessa da vida longa no cinema, mesmo tendo em mãos apenas o disparo curto sem metragens das produções em video. Ou seja fomos conclamados para um sonho dantesco sem armas, nem horizontes.
Mas falando assim até parece que foi só sofrimento, ou que estou fazendo pose de coitadinho. Não! De maneira nenhuma, toda essa trajetória foi uma escolha do grupo, dos integrantes dessa história, não há personagens do bem, nem do mal, pois nós aprendemos muito em todo esse processo, hoje somos mais inteligêntes e menos inocentes. E pudemos à partir de uma construção de valores pautados nessa experiência, construir nosso próprio processo formativo. Tivemos bons retornos em nossas oficinas criadas em cima de uma metodologia que pautava a potencialização do senso crítico para a produção midiática. Fizemos bons amigos e contribuimos para a dismistificação do conteúdo audiovisual despejados em nossos lares. E só pudemos fazer isso pelo incentivo dado pelos educadores que passaram por nossas vidas, nas ruas ou nas próprias ONGs.
Em uma avaliação geral o NCA teve de tirar leite de pedra para que permanecesse vivo como coletivo ainda hoje, podendo afirmar seus valores e princípios e apesar das barreiras, tudo que esse caminho nos rendeu de frutos nos é muito valioso, a criação do grupo foi nossa principal formação, nossa faculdade. Sabemos que outros irmãos vindos de realidades comuns à nossa sucumbiram no caminho, ou por terem abandonado o sonho por conta de necessidades financeiras, ou por terem se aliado a tudo aquilo que negavam por beneficio$ e fama.
Nós permanecemos, não sei até quando, nem direito como isso se deu, mas haverá de ser por um propósito digno.

(Daniel FagundeS – Núcleo de Comunicação Alternativa)

Um comentário:

  1. Voceis participam da melhor de todas as oficinas a oficina da vida ,E ESSA TODOS PODEM CURSAR A UNICA DIFERENÇA , É FAZER DIFERNÇA PARABÉNS ACREDITO MUITO EM VOCEIS.

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