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sexta-feira, 5 de abril de 2013

Mágoas de Março

Videopoesia produzido pelo Daniel do NCA para o trabalho de Allan da Rosa


É pau, é treta, é lodo no caminho
E no gesto o sufoco, É a gente sem ninho

É a casa arriando, o vexame em janeiro
É sirene, é resgate, reza e desespero

É o soro, a vacina, a lamparina na mão
É na face um bueiro, entupida a razão

É enchente de choro, melando o medo
É o desconsolo, cachaça, o fogo tão cedo

É o deslize previsto, é no chão o mocó
É a foice na sorte, na cacunda a dó

É o esgoto vazando, é quentar na fogueira
É a maldita sirene, a luz na nojeira

É defunto é entulho, Me desculpe o Jobim
A gaiola atolada e duro o canarin

É isopor, é garrafa, é tábua de passar
Armário boiando, a viela um mar

A parede rachada, o muro esfarela
A praia de esgoto, a tifo, a sequela

Arco-íris de vala/ Lixaiada brilhante
Criança dormindo e o berço na avalanche

É a miséria negreira em nova travessia
Oceano tumbeiro do chicote à bacia

É não ter documento, um barreiro a cozinha
Se alojar na vergonha, enterrar a vizinha

É perder certidão e brinquedo e fogão
É deslize, é desmanche e não ter quem dá mão

É o rodo que estoura e não guenta a lameira
É o balde rompendo, é friagem, é bicheira

São as mágoas de março fechando o verão
É a promessa devida da outra eleição

Arregaço na cerca, no peito e no mato
É a fossa, é o prego, a urina de rato

São as mágoas de março, é a merda no pão
Sem manta, sem copo, sem teto e sem chão

É cabeça abaixada, buscando quietar
É marmita ganhada, é a vida na pá

É o berro, o pavor, o enfarte, o despejo
A criança assustando e correndo pro beijo

A mudez do latido, a sobra da ração
Flutuando enforcada a nossa criação

É a trisca de vento, trazendo o terror
É o fedor no tempo, cobrindo o calor

É o povo espremido, o guarda-chuva virado
De podre o beliche, dormir no estrado

É enxada sem cabo, é cinco num colchão
E ainda louvar, agradecer na oração

É marreta, é olheira, é tosse, palafita
A enxurrada é tempero lavando a marmita

É sonhar ser alado e vencer temporal
É no espelho do medo, estrelar o jornal

É a chuva tão bela/ que germina a terra
No reino do pneu, o automóvel que impera

É a vingança do rio pela manta do asfalto
Rasgando avenida e jorrando pro alto

É o canal cinco chegando/ o treze, os barão
Entrevista, holofote, o lucro na locução

É a cifra banqueira levando a nação
É mangueira, é lanterna, tombo na alagação

Pirituba, Brasilândia
Mauá, Diadema, Jabaquara,
Cidade Ademar
Capão, Taboão, Embu,
Tucuruvi, Jaçanã, Guarulhos, Tiradentes, Perus, Taipas
Grajaú, Sapopemba

Cano, fé, graxa, terço, guia, capa, breja
Gorro, quadra, fio, beco, poça, bota, febre

São as mágoas de março, é a merda no pão
Sem manta, sem copo, sem teto e sem chão

São as mágoas de março fechando o verão
É a promessa devida da outra eleição

(Allan da Rosa)

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